Tenho a sina de não desligar.
A sina de viajar em mim dez mil léguas sem sair do mesmo lugar.
Quando a chuva me bate à porta e contra as janelas, então, saio de mim sem aviso, ainda de olhos abertos, e sou sugado para um qualquer recanto do mundo, atirado para dentro de um comboio a vapor sem rumo certo. E no entanto, embora sem destino traçado, todas as paragens são paragens de ti, no teu tempo, nos teus tempos, numa linha cronológica difusa.
A certeza dos dias é nevoeiro na minha mente, relegada sem intenção para um canto longínquo de mim. Mas conheço bem as paisagens. Sei-as de cor, como se as respirasse hoje mesmo. Sei de cor os montes e os prados sem fim, as sombras das árvores solitárias, a frágil fragrância das flores e as cores do céu no horizonte: amarelo fresco quando nasce o sol, laranja quente quando se põe; azul estrelado quando a lua espreita, mais ainda quando se esquece de espreitar.
Avisto-te ao longe, pelas janelas de mim, baloiçando na tua cama de rede no alpendre da casa no monte, lendo como de costume. Avisto-te mais perto, correndo pelos prados e rebolando quando te cansas de correr, a tua gargalhada de criança soando-me em eco mudo ao ouvido.
Avisto-te na sombra da primeira árvore e depois da segunda, aninhando-te para a primeira sesta de verão, depois de um almoço tardio em jeito de picnic, sobre o pano xadrez estendido, ao sabor de um vinho tinto. Avisto-te junto ao vidro do meu comboio, recolhendo as flores carmesim que aí nascem e colocando no cabelo, por detrás da orelha, uma delas, como fazias sempre - tão perto que podia sentir-lhes o cheiro, sentir-te o perfume.
Avisto-nos aos dois sentados no ramo mais forte da nossa árvore a ver o sol pôr-se antes de irmos jantar. Avisto-nos deitados nas telhas ainda quentes, a identificar entre risos as constelações nesse mar de estrelas. Avisto-te através dos meus e dos teus vidros enterrada em dois cobertores grossos nas noites frias, diante da lareira, de chocolate quente em punho, e o fumo da chaminé serpenteando em silêncio por entre o canto dos grilos lá fora.
Revejo em todas as visões de ti - quando lês, quando corres e rebolas, quando comes, quando dormes, quando fitas o horizonte, quando contas as estrelas, quando tremes com o frio - o sorriso que me desarma e abala todos os dias, como se todos os dias o visse pela primeira vez; a ternura de um mundo inteiro contida nos teus lábios.
Revejo então os teus lábios, muito perto, até que deixo de os ver e passo a senti-los, como se os tivesse aqui e agora pressionados contra os meus. Sinto o teu corpo encostado ao meu. Sinto metro e meio de abraço apertado, metro e meio de amor. Sinto o bater do teu coração com ritmo indefinido, umas vezes compassado e outras disparando. Sinto a tua paz no meu peito e o teu calor na minha pele. Sinto as tuas mãos nas minhas, os teus dedos nos meus. Sinto-nos a nós; a mim em ti nas noites só nossas. Leio-te feliz nos teus olhos e torno a deixar-me perder-me neles, como se tivesse escolha, vezes e vezes sem conta.
Abraço-te uma vez mais para não deixar fugir o momento, para não te deixar desaparecer. Este momento é tudo. Ter-te é ter tudo e eu só queria parar o tempo, congelar tudo, para te ter aqui até ao fim dos meus dias. Aperto-te nos meus braços de novo, a tua cintura contra a minha.
Deixa-me por um minuto não te largar. Deixa-me beijar-te uma vez mais, só mais uma. Deixa-me, que não tarda o meu comboio esfuma-se e eu volto a mim. Não tarda ele esfuma-se e eu torno a perder-te de vez.
terça-feira, janeiro 17, 2017
quarta-feira, janeiro 04, 2017
Resoluções de Ano Novo
Ano novo, finalmente.
Desconfio que passo os meus dias à espera deste virar da página. É só mais um dia, só mais um amanhã como todos os outros, eu sei, mas o ano novo renova-se e renova-me. Renova-me as energias, as esperanças e os sonhos. Renova-me a motivação. Entrega-me de novo à Fé.
Sim, à Fé. Eu sou uma pessoa de fé. Só não acredito nas coisas em que as pessoas normais acreditam. Em Deus e tudo isso. Mas se há coisa que eu sou é Fé. Fé na Natureza. Na vida da Terra na pulsação do vento e do mar. Fé nas pessoas. Fé no respeito. Na silenciosa simbiose tácita entre duas pessoas. Fé na bondade. Em bons pequenos gestos, em bons corações, em boa gente. Fé no amor. No campo gravítico que atravessa as fronteiras do mundo para unir duas almas. Fé no destino. Nas energias invisíveis do universo.
Sim, já sei, dar e receber, o velho e eterno karma... Sempre o karma. Oiço há anos falar dele; só ainda não tive o prazer de o conhecer. E é um bocado por aí que voltamos ao meu início: ano novo, finalmente. Talvez não te dês conta, ou não te dês o tempo e a hipótese de te dares conta, mas nós somos muito como um copo de água, que vai enchendo com os acasos da vida. E no limite, no fim dos fins, transbordamos. Para fora ou para dentro, pouco importa; depende de cada um, mas algures nesse limbo perdemos a nossa forma, a nossa estabilidade, e precisamos de nos reestruturar. E eu, pessoalmente, de tempos a tempos preciso de atirar mais lenha para o fogo da minha Fé, que vai esmorecendo e fumegando.
Nós precisamos destes ciclos. Das horas do dia, dos dias da semana, das semanas do mês, dos meses do ano e dos anos da vida. Já todos encontrámos abrigo à sombra de um "daqui por duas horas já estou em casa" ou de um "amanhã é um novo dia". De um "o fim-de-semana está mesmo aí" ou até de um "no próximo mês já vou de férias". São portos seguros que criámos sem nos apercebermos, para atracar quando a corrente fica demasiado turbulenta. O ano novo é só mais um exemplo. Com a diferença de que nos promete guardar novas 365 oportunidades de ser bem-sucedido, de ser feliz, de ser amado, de ser completo. É o ponto de viragem e recomeço mais forte deles todos.
Não te procuro, porque a Fé - a vida da Terra na pulsação do vento e do mar, a silenciosa simbiose tácita entre duas pessoas, os bons pequenos gestos de bons corações e boa gente, o campo gravítico que atravessa as fronteiras do mundo para unir duas almas, as energias invisíveis do universo - me diz que te vou encontrar num futuro incerto, nem mais tarde, nem mais cedo. Mas a cada virar de página faço muita força para que este seja o ano do futuro incerto, do nem mais tarde, nem mais cedo. Porque eu quero-te, quero-te loucamente, e porque sem te ter ainda tenho já saudades tuas. Quero dar-te a mão, entrelaçar os dedos nos teus e correr mundo fora, para conhecer contigo as maravilhas dos nossos recantos. E conhecer melhor ainda as maravilhas dos teus recantos, os encantos dos teus jardins e as dores dos teus desertos, que sei que guardas para além dos teus olhos e do teu sorriso. Quero beijar-te o pescoço; quero viver-te, quero amar-te. E quero acordar todos os dias, sem mais, à luz do teu sorriso e do teu olhar, ao sabor quente do teu beijo húmido, ao calor do teu toque frio.
Sem saber onde nem quando, sinto e sei que estás aí. E eu, de Fé renovada, só quero (ardo de desejo) que este ano seja de vez.
Desconfio que passo os meus dias à espera deste virar da página. É só mais um dia, só mais um amanhã como todos os outros, eu sei, mas o ano novo renova-se e renova-me. Renova-me as energias, as esperanças e os sonhos. Renova-me a motivação. Entrega-me de novo à Fé.
Sim, à Fé. Eu sou uma pessoa de fé. Só não acredito nas coisas em que as pessoas normais acreditam. Em Deus e tudo isso. Mas se há coisa que eu sou é Fé. Fé na Natureza. Na vida da Terra na pulsação do vento e do mar. Fé nas pessoas. Fé no respeito. Na silenciosa simbiose tácita entre duas pessoas. Fé na bondade. Em bons pequenos gestos, em bons corações, em boa gente. Fé no amor. No campo gravítico que atravessa as fronteiras do mundo para unir duas almas. Fé no destino. Nas energias invisíveis do universo.
Sim, já sei, dar e receber, o velho e eterno karma... Sempre o karma. Oiço há anos falar dele; só ainda não tive o prazer de o conhecer. E é um bocado por aí que voltamos ao meu início: ano novo, finalmente. Talvez não te dês conta, ou não te dês o tempo e a hipótese de te dares conta, mas nós somos muito como um copo de água, que vai enchendo com os acasos da vida. E no limite, no fim dos fins, transbordamos. Para fora ou para dentro, pouco importa; depende de cada um, mas algures nesse limbo perdemos a nossa forma, a nossa estabilidade, e precisamos de nos reestruturar. E eu, pessoalmente, de tempos a tempos preciso de atirar mais lenha para o fogo da minha Fé, que vai esmorecendo e fumegando.
Nós precisamos destes ciclos. Das horas do dia, dos dias da semana, das semanas do mês, dos meses do ano e dos anos da vida. Já todos encontrámos abrigo à sombra de um "daqui por duas horas já estou em casa" ou de um "amanhã é um novo dia". De um "o fim-de-semana está mesmo aí" ou até de um "no próximo mês já vou de férias". São portos seguros que criámos sem nos apercebermos, para atracar quando a corrente fica demasiado turbulenta. O ano novo é só mais um exemplo. Com a diferença de que nos promete guardar novas 365 oportunidades de ser bem-sucedido, de ser feliz, de ser amado, de ser completo. É o ponto de viragem e recomeço mais forte deles todos.
Não te procuro, porque a Fé - a vida da Terra na pulsação do vento e do mar, a silenciosa simbiose tácita entre duas pessoas, os bons pequenos gestos de bons corações e boa gente, o campo gravítico que atravessa as fronteiras do mundo para unir duas almas, as energias invisíveis do universo - me diz que te vou encontrar num futuro incerto, nem mais tarde, nem mais cedo. Mas a cada virar de página faço muita força para que este seja o ano do futuro incerto, do nem mais tarde, nem mais cedo. Porque eu quero-te, quero-te loucamente, e porque sem te ter ainda tenho já saudades tuas. Quero dar-te a mão, entrelaçar os dedos nos teus e correr mundo fora, para conhecer contigo as maravilhas dos nossos recantos. E conhecer melhor ainda as maravilhas dos teus recantos, os encantos dos teus jardins e as dores dos teus desertos, que sei que guardas para além dos teus olhos e do teu sorriso. Quero beijar-te o pescoço; quero viver-te, quero amar-te. E quero acordar todos os dias, sem mais, à luz do teu sorriso e do teu olhar, ao sabor quente do teu beijo húmido, ao calor do teu toque frio.
Sem saber onde nem quando, sinto e sei que estás aí. E eu, de Fé renovada, só quero (ardo de desejo) que este ano seja de vez.
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