segunda-feira, dezembro 05, 2016

Estrelas no Céu

O dia nasceu sem cor, como todos os outros para mim desde aquela noite.

O telefone tocou de mansinho e eu estremeci da cabeça aos pés. Estremeço sempre que o sinto vibrar, só de recordar aquela chamada da Mãe que me arrancou do sono para me dar a notícia. Aquele murro no estômago que adorava nunca ter sentido.

Puxei o telemóvel do bolso e tive um breve vislumbre do teu sorriso, eterno no meu fundo de ecrã, antes de surgir a imagem da Mãe a chamar do outro lado da linha. Sabia que dia era hoje e portanto hesitei por uns segundos.

Atendi.

Senti-lhe na voz a dor e as lágrimas, bem como o esforço que fazia para as esconder entre soluços leves. Num murmúrio, deu-me os parabéns que não pôde dar-te a ti. Fazes dezassete anos hoje. Farias, aliás... Mas faz um ano que partiste. Faz um ano que a merda do SMS urgente te levou de nós a ferros. A pneus e a pára-choques. Assim, sem mais.

Este mundo é um lugar cruel e tu, de todas as pessoas, não merecias isto.

Desligo a chamada e a tua fotografia volta a ocupar o ecrã, no teu vestido azul, a sorrir para mim. Estás aqui há um ano. Que saudades que eu tenho desse teu sorriso que iluminava tudo e todos. Da tua gargalhada que me aquecia o coração. Desses teus olhões que viam o mundo de outra forma.

Lembro-me repentinamente dos nossos serões à lareira, tu a ler o teu livro de cabeça apoiada no meu colo, toda intelectual, e eu a ver filmes sem som para não te incomodar. Dava tudo só por mais um dia. Só para poder voltar a sentir a tua cabeça quente contra a minha barriga. Para poder voltar a coçar-te a nuca e a afagar-te o cabelo até adormeceres no meu abraço. Para poder voltar a carregar-te nos braços escada acima, numa guerra para não deixar cair a manta com que te tapavas, e deitar-te na cama. Só para poder voltar a dar-te um último beijo de boa noite. Dava tudo... Tudo.

Demoro-me um bocado a olhar o céu.
Imagino que tenhas encontrado aí um lugar e que andes por aí aos pinotes, ligada à corrente, como boa pulga que sempre foste. A espalhar o teu riso aos ventos e a contagiar todas as outras estrelas com esse teu brilho. És o meu orgulho.

Onde quer que estejas, por favor sê feliz.
Com carinho, um beijo na testa do teu irmão que tanto te ama.

Parabéns, Miúda.

(P.s.: Por favor controla a chuva de perdigotos no bolo.)

[Primeira parte em: http://vidadepoetamilitar.blogspot.com/2016/01/bittersweet-sixteen.html?m=1 ]

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