O mundo dela era sombrio.
Por fora andorinha em constante migração, por dentro prisioneira de guerra encarcerada numa masmorra. De mordaça na boca e envolta em mil grilhões. Suspensa pelos pés. Todos os dias ela respirava a custo dentro do seu próprio colete de forças, observando o mundo lá fora do avesso. De que serve a liberdade exterior quando se é escravo e refém de si próprio?
O mundo dela era um inferno. Todos os dias a vida dela pegava fogo e ela via o mundo incendiar-se à sua volta e desfazer-se a seus pés. Mas era ela o fósforo, a gasolina e o oxigénio. O calor, o combustível e o comburente. E sufocava no seu fumo.
O mundo dela era um programa de computador. Zeros e uns. Um pára-arranca. Um tic-tac oscilando entre o ser e o não ser. O ir e o ficar. O querer e o não querer. O viver morto e o morrer acordado. Na batalha entre ela e ela mesma, quem quer que desse a última estocada era ela que morria.
E ela um dia disse-me que há portas para lá da vida que eu não compreendia. E não compreendi. Mas a maior guerra é aquela que decorre no nosso interior, no nosso silêncio vagabundo.
É aí que começa a revolução.
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