sexta-feira, janeiro 02, 2009

Para Lá de Fogo!

Fechei os olhos para pensar novamente no que me transborda na alma, que é, para lá de muita coisa que não se explica, amor. Amor sem igual, no âmago de um mundo que esquece ou já nem sabe o que amor é. Se há maior orgulho do que aquele de quem enverga uma farda com séculos de história, em memória digna de gerações e gerações, que são família, então desconheço-o. E se o desconheço, tu desconhecê-lo-ás também, porque será uma pedra na vida, de que ninguém quererá falar ou ouvir. O maior orgulho é aquele que nos queima o coração. Amor que me afoga em lágrimas, quando ouso olhar para o passado. Amor que me inunda quando aperto, um por um, os botões d'O Dólman e quando piso as mesmas pegadas de gentes do mesmo sangue que, um dia, viveram o que vivo e se tornaram grandes homens. Grandes portugueses. Lembrança de uns que deixaram já a vida por eles passar. Subiram na vida por trabalho de algo que me é comum. Comum a todos os que da Luz Meninos são! A chama, que há tanto ano arde, vive em mim e em nós e não dorme. E neles viveu também, adormecida na eternidade. Chama que se acende por sentimentos que as palavras tentam, em vão, descrever. Mas é, com toda a certeza, amor a uma Casa: o nosso Colégio Militar. Nosso, de todos aqueles que seguiram, seguem e seguirão com fé os valores de um Criador iluminado, triunfante de tempos para trás deixados. Fundador distinto, Marechal António Teixeira Rebello, que, de tão corajoso, partilhou com todos um sonho que era só seu. E do sonho nasceu a Obra. Do sonho nasceu a realidade, como da terra brotam as flores, que só com Amor se firmam belas. E voltamos ao início de tudo. Amor, para lá do Fogo que, na alma, se faz vibrar. Amor em lembrar os anos em combate, luta dura em ardor, por uma Pátria que é nossa e de mais ninguém. Amor em repetir e continuar as batalhas onde guerrearam nossos irmãos e primos, nossos pais e tios, nossos avós e também os seus avós. Honra e orgulho. Honrados por viver aquele mesmíssimo sonho, tão ousado, que é Utopia, no seio de um mundo por si próprio condenado. E orgulhosos por erguer as espadas dos antepassados, nossos irmãos, e, com elas, vencer e conseguir os demais triunfos, por eles deixados por conquistar. Se houver algo neste mundo com tamanha grandeza, esperarei encontrá-lo. Tesouros destes não há muitos, garantidamente. Tesouros que, mais ricos do que qualquer fortuna, enchem e preenchem a alma de qualquer um. Quem sabe consente. Tesouros que, em retrospectiva, me fazem tremer da cabeça aos pés, tanto quanto tremi quando atravessei as portas daquele mundo desconhecido pela primeira vez! E ao amor e a tudo aquilo que me traz as lágrimas aos olhos, quando caio na tentação de reviver os fogos memoriais do que passou, junta-se mais e mais saudade. Saudade porque aquilo que me construíu me vai abandonando aos poucos, fumo do meu fogo. E vejo-o partir devagar, mas parece querer fugir mais depressa. Chamo-o, mas não pára. Peço-lhe para voltar, mas não volta! Como qualquer coisa que parte, de costas voltadas, deixa a marca. Deixa a dor e o vazio. Mas chamar-lhe «qualquer coisa» seria ingratidão da minha parte. É Casa sem congénere. E esse amor que dá e que deixa é tão reconfortante, tão singular, que arriscaria uma mais ousadia, ao dizer que é amor maior do que todos e do que qualquer um. Gritaria aos quatro cantos do mundo que o Colégio Militar, minha perpétua Paixão, representa e tem o que de melhor há nele. Palavras serão sempre palavras e não mais do que isso. Mas a lágrima que cai completa-as.
É saudade, meu amor, é saudade. Saudade que até mim veio e que a meu lado se sentou. Veio para ficar. Saudades tão pequenas, amontoadas numa só, tão gigante: saudades de cada pedrinha que faz de ti quem és, saudade das tuas paredes e tectos. Saudades do espírito que te habita. Saudades dos bons e dos maus momentos. Saudades da tua vida, da tua alegria e da bondade com que me acolheste. A mim e aos meus irmãos. Saudades de tudo. Perder tudo isto. Perder-te assim, como sei não haver alternativa. Mas depois de tudo... é impossível não doer.
Mas sim, fica jurado que te levarei para todo o lado. Fazes parte da alma, parte do passado e do presente, parte do futuro, parte de tudo. Tu és eu. E já há muito.
Um agradecimento será pouco para o que aconteceu e para o pouco que está para vir. Mas receio não poder dar mais do que isso. Assim, dou-te tudo - que é sempre pouco - o que tenho. Não consigo escrever mais... as palavras não chegam.
Estás e para sempre ficarás aqui dentro.

Tomás, 108 de 2001
2 Jan 2009