Há pouco cheirei um lugar.
Sim, leste bem. Um lugar.
Não uma fragrância, mas um lugar, um momento.
Aquela nesga de ar perfumado entrou em mim sem pedir autorização e na mesma fracção de segundo transportou-me para longe daqui. Abandonei o meu corpo e vi-me cirandar indefinidamente por aí, fora de mim, algures no espaço. Algures no tempo, diria também.
Era-me familiar o perfume. De certa forma, cheirava-me a felicidade. A conforto. A infância inocente. Ao colo protector de um Pai. Ao amor de um Avô. A casa. À casa de alguém querido. Aos cabelos ou às roupas da protagonista de um namoro feliz. A um passeio no parque em plena Primavera. À casa de férias de Verão. A um episódio muito particular da minha vida, talvez. Quem sabe...? Mas cheirava. Cheirava-me a algo terno, muito meu, há muito perdido no tempo. E enquanto o inspirei e expirei e tornei a inspirar mantive-me suspenso nesse lugar distante, nesse fragmento anónimo do meu ser, alheio e separado de mim.
E então, no mesmo abrir e fechar de olhos, deixei de o sentir, deixei de o respirar. E sem saber em que lugar e em que tempo estivera, ou quanto tempo estivera ausente, retornei a mim, ao mundo que não tinha parado de girar à minha volta.
O lugar daquele cheiro fechou-se bruscamente como uma gaveta em mim e deu a volta à chave. Quase podia ouvir-lhe o trinco estalar. Perdi-lhe o rasto... Perdi-lho, mas agora estou seguro de que haverá em mim mais uma centena dessas gavetas, um módulo carregado delas, apenas à espera da chave certa para saltar para fora e me levar de novo para o outro lado do mundo, para um tempo de que já mal tenho memória.
Sorrio e aguardo.
Pode ser que te torne a encontrar.
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